sábado, 29 de junho de 2013

Passeio, passagens e história - Vila Assunção

         É sábado, meio de uma manhã cinzenta, um grupo de pessoas aguarda em frente ao totem do Caminho dos Antiquários, no centro de Porto Alegre. Numa iniciativa muito legal, surgida da parceria entre Secretaria da Cultura (SMC), Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo e Programa Viva o Centro, essas pessoas estão prestes a conhecer um pouco da história de um dos bairros mais charmosos de nossa cidade: a Vila Assunção, na Zona Sul da Cidade. Um ônibus espera o embarque do pessoal, e depois segue costeando o Guaíba, até alcançar a Capelinha da Assunção, ponto inicial de uma jornada aos encantos do lugar.

          A caminhada é guiada por um profundo conhecedor da região, André Huyer, especialista em Patrimônio Cultural em Centros Urbanos e Mestre em Planejamento Urbano e Regional, que vai nos contando a história da formação do bairro, antigo balneário da cidade. Ele foi projetado em 1937, pelo urbanista Ruy Viveiros Leiria, sobre a gleba da viúva de José Assumpção, com 130 hectares. O projeto aplicou vários princípios derivados do conceito de cidade-jardim, com abundância de praças e áreas verdes interligadas, moradias de centro de terreno, um núcleo de comércio e serviços, urbanização da praia, mitigação de pedreiras, traçado viário adaptado à topografia, passagens de pedestres interligando quadras e áreas comuns nos centros das quadras.
Participantes do passeio ouvindo André Huyer contar histórias do bairro
              Hoje, apesar de a revisão do plano diretor ter retirado muito da proteção que a região tinha por ter sido considerada área de interesse cultural, ainda podemos observar muitas das características da época, inclusive com construções cujo estilo arquitetônico é conhecido como californiano (a própria capela, marco inicial de nosso passeio, é um belíssimo exemplo). Passeamos pelo bairro utilizando pelo menos duas das inúmeras passagens de pedestres que a prefeitura vem negociando com os lindeiros, para que sejam fechadas (como mais de uma centena espalhadas pela cidade). Tais passagens são importantes tanto pelo aspecto de mobilidade interna, quanto pela própria ambiência, pois foram projetadas como parte integrante da paisagem, tendo um traçado peculiar.
Passagem de pedestre Av. Guaíba
   

         
          Sobre as escadarias da Vila Assunção, existe um termo de ajustamento de conduta entre o Ministério Público e a Prefeitura, no sentido de formar um grupo de trabalho que irá avaliar não só a viabilidade das passagens de pedestre, como também as condições de outras áreas públicas, muitas delas invadidas atualmente. Mas é preciso que a comunidade também participe do processo de manutenção desses locais. E isso é feito pelo cuidado que se deve ter, como se tais áreas comuns fossem parte de suas próprias casas. Não colocar ali restos de poda, de construção ou de lixo doméstico, como se vê diariamente. Para conscientizar os moradores e dar visibilidade a esse assunto, a associação de moradores da Vila Assunção, em conjunto com o coletivo Passagem com Arte, está organizando um evento para o dia 20 de julho, na escadaria da Av. Guaíba, próxima ao SAVA Clube. Aguardem para breve o convite!
          Depois de duas horas do passeio guiado, voltamos ao ônibus, que nos conduziu rumo ao centro da cidade. Conhecemos mais esse capítulo de uma história que devemos ajudar a preservar. Nossa memória e nossa cultura precisa da preservação do patrimônio cultural, que só é possível, existindo o conhecimento. Bem-vinda a iniciativa desses passeios que contam nossa história e, assim, nos ajudam a pedir: chega de demolir Porto Alegre!

Santuário de Schoenstatt
Mirante em frente à Praça Araguaia






Visite a página do coletivo Passagem com arte.
Projeto Viva o Centro a Pé :
As caminhadas do Viva o Centro a Pé são realizadas três vezes por mês, sempre aos sábados, orientadas por professores especialistas em história, arquitetura ou áreas afins.
Os interessados devem solicitar inscrição pelo e-mail vivaocentroape@gmail.com e aguardar confirmação. Para participar é necessário doar alimentos não perecíveis, que serão encaminhados a instituições do município. Outra opção é a doação de ração para cães e gatos, que será destinada aos animais, por meio da SEDA (Secretaria Especial dos Direitos Animais).

sábado, 22 de junho de 2013

A Utopia da Autonomia - lição de Manuel Castells

Diante das intensas e amplas mobilizações ocorridas no Brasil, o pensador contemporâneo mais citado nas últimas semanas foi o sociólogo espanhol Manuel Castells. É dele a triologia Sociedade em Rede, e, desde os anos 90, vem analisando as mudanças nas comunicações e relações na sociedade, a partir dessa nova dinâmica de difusão de informação. No novo livro, ainda não lançado no país, Castells analisa os movimentos sociais ocorridos na história mundial recente. Dentre as muitas reflexões, o sociólogo tenta identificar características comuns em movimentos ocorridos em contextos tão díspares, como as ocorridas no Egito, Espanha e Estados Unidos. Compartilho, e esse é um termo muito apropriado para o tema, trechos do livro, de minha livre tradução, sobre as citadas características, pois acredito que estamos vivenciando a utopia da autonomia.
A partir da análise dos movimentos sociais da última década, Castells identifica um número de características comuns dentro desta nova forma de relação encontrada no século XXI. A primeira delas é que os movimentos sociais utilizam múltiplas formas de conexão. O uso da internet e de celulares é essencial, mas além das conexões que se estabelecem online e offline, existem redes sociais pré-constituídas, bem como formadas durante as ações dos movimentos.
Uma segunda característica é que, apesar de os movimentos usualmente iniciarem nas redes sociais da internet, eles só se tornam um movimento quando ocupam o espaço urbano. Esse espaço de ocupação se dá em lugares ou prédios simbólicos e, com a possibilidade de interação entre os participantes através de acesso à internet, dá origem a um terceiro espaço, híbrido de espaço virtual e espaço urbano, que Castells denomina de espaço de autonomia, uma nova forma espacial de movimentos sociais em rede.
Outra característica apontada é que os movimentos são locais e globais ao mesmo tempo. Eles se iniciam por questões locais, em contextos específicos, construindo seu espaço público através da ocupação urbana e da articulação das redes da internet. Mas também são globais, pois são conectados ao mundo, aprendendo com outras experiências e, até mesmo, inspirados nessas, de forma a propiciar um maior engajamento em suas próprias mobilizações.
Em termos de gênese, esses movimentos são largamente espontâneos em sua origem, usualmente disparados por uma centelha de indignação, relacionada a um evento específico ou ao somatório de insatisfações com relação aos governantes. Em ambos os casos, são originados de um chamado à ação, criando uma comunidade de insurgentes. A origem de tal chamado é menos relevante do que o impacto da mensagem nos múltiplos e indeterminados receptores, que se conectam emocionalmente com a forma e o conteúdo da mensagem. Destaca-se que as mensagens que contêm imagens têm um potencial maior de mobilização.
Os movimentos são virais, seguindo a lógica das redes de internet. Não só pela característica da difusão das mensagens, mas pelo efeito dos movimentos surgindos em todos os lugares. Assistir e escutar os protestos em outros lugares, mesmo que em contextos distantes e em diferentes culturas, inspira a mobilização porque aponta com a esperança da possibilidade de mudança.
A transição da indignação para a esperança é acompanhada de deliberação no espaço de autonomia, que ocorre através de assembleias ou comitês designados em assembleias. Isso se justifica pela já comentada ausência de líderes e pelo sentimento de descrédito na representação política vigente e conhecida. A questão chave para o movimento é a união, sentimento através do qual as pessoas vencem o medo e descobrem a esperança. A união é ponto de partida e fonte de empoderamento, que se estabelece numa rede horizontal, sustentada pela cooperação e solidariedade, prescindindo de lideranças formais.

Além disso, conclui Castells, tais movimentos são altamente autorreflexivos, questionando-se indivíduo e coletivo, raramente programáticos, não violentos e políticos em sentido amplo. Eles projetam uma nova utopia de democracia em rede, baseada nas comunidades local e virtual em interação. Acrescenta, ainda, que utopias não são meras fantasias. A maioria das ideologias políticas modernas têm suas raízes em sistema políticos originados de utopias. O que esses movimentos estão propondo em suas práticas é uma nova utopia no cerne da cultura da sociedade em rede: a utopia da autonomia do sujeito em face às instituições da sociedade.
Existe também um site sobre o sociólogo espanhol. Para saber mais, clique aqui.
http://www.laparola.com.br/as-manifestacoes-filmadas-pelos-manifestantes
Fontes: Networks of outrage and hope, social movements in the internet age. Manuel Castells.  Cambridge: Polity, 2012.

sábado, 15 de junho de 2013

Chega de demolir a democracia

          As últimas semanas trouxeram ao Brasil um sopro de esperança. Em meio a comoção nacional, engendrada pela Copa das Confederações, uma parcela significativa de nossa população resolveu ir às ruas para mostrar o que realmente é capaz de modificar nosso país. Não são as obras faraônicas, estádios fadados ao esquecimento, que trarão um sem número de empregos. Não são as intervenções de infraestrutura, razão de despejos em massa a que temos assistido em todos os estados comprometidos com a FIFA, que construirão uma cidade melhor. Não são as decisões tomadas em gabinetes e privilegiando alguns, aniquilando identidade e patrimônio ambiental e cultural da cidade, que consolidarão a cidadania em nosso cotidiano. E esses são os legados esperados para a Copa.
http://www.portal2014.org.br/midia/andamento-obras-obras/thumb220.jpg
Custo do estádio Mané Garrincha em Brasília: R$ R$ 1,015 bilhão (Fonte: Portal 2014)
          Mas o efeito anestésico do futebol não foi completo, e as pessoas saíram às ruas para mostrar sua indignação. Indignação com o preço das passagens de ônibus, abusivas e pagando um péssimo serviço. Com a derrubada de árvores e sepultamento de parques, contrariando a posição das comunidades atingidas e golpeando de morte a qualidade de vida da cidade. Com leis que são flexibilizadas de forma a possibilitar todo o tipo de negociata e vantagens para determinados setores, independente das consequências nefastas para famílias que veem suas histórias serem apagadas por retroescavadeiras em minutos. Com um orquestrado movimento que, pouco a pouco, vem diminuindo os direitos e garantias conquistadas com muita luta e a custa de morte e tortura.
       O valor das passagens de ônibus foram um estopim, detonando o barril de pólvora onde está armazenado o descaso absurdo do poder público com a população. O movimento que vem se organizando através de espaços alternativos de discussão é legítimo e necessário. É o grito de basta, que está entalado na garganta daqueles que, indignados com a realidade do país, vem a público mostrar que a mudança é possível. E pudemos avaliar a força deste BASTA, pela aparato policial que o Estado usou para conter as manifestações nas diversas cidades em que eles ocorreram, em especial, São Paulo.
Fonte: Site Record
         A desproporção entre atos de vandalismo que efetivamente aconteceram e a repressão imposta a todo e qualquer cidadão, incluindo a imprensa, que ousasse estar nas proximidades da manifestação foi a confirmação de que o exercício do direito de reivindicar é ameaçador. Representa uma quebra de paradigma do comportamento do brasileiro do país das novelas e do futebol, tão dócil e alheio às mobilizações políticas. Sentem-se ameaçados os poderes públicos, que são afrontados e cobrados, posto que deveriam representar os anseios  de seus representados. Os poderosos meios de comunicação também desempenham seu papel de mantenedores do status quo, divulgando versões e tratando movimentos sociais como arruaça. Tudo estruturado para manter o poder e as vantagens decorrentes desse.
        Apesar disso, as pessoas que foram às ruas mostraram que o país é maior que a Copa, maior que a FIFA, maior que a estrutura política decadente e corrompida. O país é, antes de tudo, seu povo, que começa a engrossar o coro da indignação contra todos os atos contrários à sua soberania. As manifestações vão continuar, organizadas por redes sociais ou entidades, colocando mais gente na rua e com informações sendo divulgadas através da imprensa alternativa. Hoje, temos mais independência do que nos é passado como verdade pelos monopólios da informação e mais ferramentas de organização. Nossa história de lutas nos dá suporte para sonharmos em construir um novo capítulo da democracia, agora mais direta e extraordinariamente participativa.

Fonte: Site Jornal Hoje em Dia

          Agora, sábado de tarde, dia 15 de junho, estou indo a uma manifestação no Parque da Redenção, contra o ESTATUTO DO NASCITURO, que é uma afronta aos direitos humanos, em especial ao direito das mulheres. Deixo abaixo o link de um site muito interessante sobre coisas que não foram ditas pela grande imprensa. Clique em 24 Momentos dos protestos em São Paulo que você não verá na TV.


Fontes:
Portal 2014: http://www.portal2014.org.br/andamento-obras/8/Mane+Garrincha.html
Site Record (Diário de informação generalista especializado em desporto) http://www.record.xl.pt/fora_campo/interior.aspx?content_id=827470
Jornal Hoje em dia: http://www.hojeemdia.com.br/minas/jovens-de-bh-se-reunem-no-sabado-e-prometem-manifestac-o-t-o-impactante-quanto-a-de-s-o-paulo-1.135177

sábado, 8 de junho de 2013

Bazar do Bonde - Zona Sul de Port Alegre construindo sua identidade

          Hoje (8 de junho) e amanhã, estará acontecendo o Bazar do Bonde. A ideia é congregar artesãos, inicialmente do bairro, oportunizando que eles exponham seus trabalhos e possibilitando sua comercialização. A aposta já seria boa por si só, pois incentiva trocas econômicas, mobilizando as pessoas a expressar sua criatividade e habilidades.
          Mas a proposta foi além. Houve um workshop circense, ministrado por Mathias Teichmann, que levou para o evento uma estrutura para realização de aulas em tecido marinho e demonstrou como se faz  maquiagem artística. O grupo Garganimações (conheça mais clicando aqui), escola de circo da região, também se fez presente, mostrando alguns exercícios circenses para quem participava do evento.
Mathias Teichmann




Garganimações


          Além desse show de acrobacia e circo, também estava reunido naquele espaço cultural o grupo literário de trovadores, participantes da UBT (União Brasileira de Trovadores - saiba um pouco mais clicando aqui), capitaneado por Flávio Steffani. 




          Mas o que acontece num evento destes vai além da comercialização de artesanato, de encontro de grupos, de apresentações de espetáculos, ainda que isso já seja a plena realização do que havia sido proposto. Contudo, o mais importante que acontece quando surgem oportunidades como essa, é a possibilidade de se criar conexões entre todas as manifestações culturais e a enorme quantidade de ideias que se congregam com o objetivo do exercício de cidadania e de construir a identidade da região. Basta uma passadinha por lá: grande projetos são alinhavados, muitos sonhos são concebidos e ótimas parcerias são iniciadas. 
          Parabéns aos participantes do bazar, que, logo, deve entrar para o calendário de eventos da Zona Sul. Parabéns especialmente às organizadoras, Angela Ponsi e Claudia Pardal. Aproveitem que amanhã tem mais!! Clique aqui para acessar a página do evento no facebook.