Há
muitos dias, estamos sendo bombardeados pela chamada grande mídia com a notícia
de que, em setembro, será inaugurado o “Marco Zero” do projeto de revitalização
do Cais Mauá, que leva o nome de Cais Embarcadero. Com pompa e circunstância, e
direito a mimos caros anexados aos convites, foi realizado um evento no dia 22
de abril, que contou com a presença do prefeito e de vereadores, além do
público-alvo, investidores e comunicadores.
Foto: Fabiano do Amaral (Site Correio do Povo, 22/04/2019) |
Muita
festa e confete, sempre com o propósito de passar a imagem de que alguma coisa
está em andamento no local em que já deveria estar em obras, pelo menos desde
dezembro de 2017, quando o consórcio de empresas que é responsável pela
execução do projeto recebeu a última licença, a de instalação. Mas nada ocorreu
até agora. E por quê?
Diferente
de tudo o que é dito pelo consórcio, e amplamente divulgado pela imprensa, a
culpa não é da burocracia, nem da sociedade civil. A responsabilidade é
exclusiva do grupo que assinou, em 2010, um contrato de arrendamento com o
Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Naquele contrato, assim como no edital
de licitação, há uma cláusula cujo objetivo é assegurar a execução do projeto.
O grupo que ganhasse a licitação deveria apresentar uma carta de capacidade
financeira de R$ 400 milhões.
Esta
garantia jamais foi apresentada, fato que vem contando com a anuência de vários
gestores públicos, contrariando o princípio administrativo da supremacia do
interesse público. A captação de recursos foi proposta a partir de investimentos
em fundos de pensão, tendo sido constituído o Fundo de Investimento em
Participações Cais Mauá (FIP Cais Mauá). Muito dinheiro foi investido neste
fundo, mas os recursos jamais foram aplicados nas obras.
Na Siqueira Campos, um dos endereços que tiveram
busca da Polícia Federal nesta manhã
Foto: Ronaldo Bernardi / Agência RBS (20/04/2018)
|
Por
conta disso, a Polícia Federal deflagrou a operação Gatekeeper, que investiga –
ainda está em atividade – o desvio de recursos, tendo feito apreensão de bens de
pessoas ligadas à administração do consórcio Cais Mauá do Brasil S.A., naquela ocasião. Em Palmas
(TO), existe uma CPI para apurar o desparecimento de R$ 30 milhões, sendo que o
atual gestor do consórcio, Eduardo Luzardo da Silva, já foi chamado a dar
esclarecimentos naquela cidade.
Ou
seja, não há dinheiro, nem credibilidade para o projeto. E quem diz isso? Luiz
Felipe Terra Favieri, da LAD Capital, atual empresa responsável pela captação
de recursos: “O Cais vem de
um estresse muito grande. Assumimos, implementamos um diagnóstico e verificamos
falhas como falta de liquidez, de credibilidade e necessidade de ajustes
contratuais” (site Radio Guaíba, 22/03/2019).
Frente
o adiamento interminável do início das obras, da incapacidade financeira e da
falta de credibilidade no mercado, o atual governador, Eduardo Leite, constituiu
um grupo de trabalho para analisar o caso. Em 08/04/2019, o grupo reuniu-se
para apresentar suas conclusões, que apontavam para que o contrato de
arrendamento fosse rescindido, por descumprimento de cláusulas.
Entre
os problemas citados, está uma dívida de cerca de R$ 6 milhões para com o
Estado, perda de prazo para o licenciamento ambiental e a falta e
descumprimento da cláusula que obriga o reparo de danos e avarias aos armazéns.
Além disso, um parecer emitido pela Procuradoria Geral do Estado considera que
o consórcio perdeu o direito a reajustar o contrato.
Foto: Itamar Aguiar (Site do Jornal do Comércio, 12/04/2019) |
Então,
o Cais Embarcadero é um paliativo, para agradar à população, que acredita que
terá acesso ao cais, e uma tentativa de demonstrar que algo está sendo
executado. Mas o que está sendo apresentado não consta do projeto inicial, que
foi resultado de um edital e definido entre as partes, servindo de chamariz
para eventuais interessados. Aliás, outra irregularidade.
Foto: Katia Suman, 16/10/2017 |
Foto: Jefferson Botega (site GaúchaZH, 22/11/2017) |
Somado a esse fato, está em curso um inquérito civil na Promotoria de Defesa do Meio Ambiente (Ministério Público Estadual), referente ao bens tombados, uma Inspeção Especial no Tribunal de Contas do Estado e o Ministério Público de Contas também aponta o descumprimento contratual. As irregularidades são evidentes. Há 4 ações judiciais questionando a proposta de revitalização, sendo que 2 delas pedem a rescisão do contrato por descumprimento de cláusulas. Assim, resta a pergunta: os administradores públicos e representantes do legislativo não temem ser responsabilizados por este dano ao patrimônio público e por improbidade administrativa?
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