Uma jornalista da grande mídia escreveu nota em sua coluna, em tom de reprovação, dizendo que “mesmo com as obras do Cais Mauá em andamento, a prefeitura de Porto Alegre segue recebendo pedidos de informações do Ministério Público e o Tribunal de Contas que deveriam ter sido feitos antes dos licenciamentos” *.
Foto: Muriell Krolikowski |
Cabe algumas considerações acerca desta afirmação. A primeira é que se o Ministério Público e o Tribunal de Contas estão questionando e necessitam de informações, nada mais estão fazendo do que cumprir com sua obrigação de fiscalizar a lisura e a regularidade do projeto. Pouco importa em que fase se encontra a realização das obras: se houver dúvidas sobre atos que envolvam o patrimônio público, como é o caso, não há limitação de tempo para que sejam esclarecidas e, eventualmente, solucionados os problemas.
Segundo, engana-se a jornalista, que mais do que ninguém deveria buscar esclarecer os fatos, sobre a cronologia dos acontecimentos. As informações sobre o projeto e sobre o cumprimento do contrato de arrendamento assinado entre o Estado do RS e o consórcio Cais Mauá do Brasil vêm há muito sendo requeridas pelos órgãos citados e outros. Ocorre que, mesmo sem essas respostas, o Poder Público achou por bem levar a diante o projeto.
Não é à toa que existem quatro ações judiciais – três Ações Populares e uma Ação Civil Pública – questionando a regularidade no cumprimento do contrato e problemas relativos às leis que regulam a ocupação do espaço público na orla do Guaíba. Ou seja, o questionamento é anterior aos licenciamentos.
Quanto ao Ministério Público Estadual, a Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente de Porto Alegre abriu um inquérito civil em 2009, para averiguar possíveis danos ao patrimônio cultural em decorrência das obras do cais. O procedimento ainda está em curso, pois não foi afastada a possibilidade de haver danos irreversíveis. Logo, são pedidos de informação que foram feitos muito antes dos licenciamentos.
E isso também tem relação com o questionamento feito pelos órgãos públicos ao qual a jornalista se revolta: “fornecer parecer da SMURB a respeito da manutenção das visuais da Usina do Gasômetro desde a Rua da Praia, apresentando estudo de impacto visual posterior gerado pela travessia em desnível, incluindo o volume do próprio empreendimento (shopping)”.
O pedido de informações sobre o assunto também não é nenhuma inovação. A preocupação aqui assinalada é o impacto que o projeto trará na paisagem de Porto Alegre, justamente pelo fato de que o cais do porto é um espaço emblemático e de identificação da cidade. E um dos primeiros questionamentos feitos foi justamente sobre a modificação drástica que o projeto que foi escolhido traria ao nosso cartão postal, não só pelo Ministério Público, mas também pela população, através das manifestações dos movimentos sociais.
No mesmo sentido, em dezembro de 2016, o IPHAN publicou portaria com as diretrizes que deveriam ser observadas em relação ao entorno dos bens tombados pela União, com recomendações específicas sobre a área do cais. A Associação Amigos do Cais do Porto (AMACAIS) e o Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento do Rio Grande do Sul (IAB/RS) encaminharam ofício ao IPHAN questionando se essas diretrizes estavam sendo observadas, exatamente um ano antes da liberação do último licenciamento.
Quanto ao Tribunal de Contas do Estado, as inspeções especiais abertas, que analisam irregularidades encontradas, prosseguem há anos, sem que todas as repostas tenham sido dadas e as indicações feitas tenham sido cumpridas. Portanto, quem não está observando as etapas são o consórcio e o poder público, obstinados em executar um projeto que jamais dialogou com a cidade e sua população.
Coletivo A Cidade Que Queremos – Porto Alegre
* Fonte: Zero Hora. “Cais Mauá, uma novela sem fim”. Sábado e domingo. 31 de março e 1º de abril de 2018
Publicado originalmente no blog do Coletivo A Cidade Que Queremos, em 02/04/2018.https://coletivocidadequequeremos.wordpress.com/2018/04/02/atualizando-a-grande-midia-sobre-o-caso-cais-maua/